Consulta médica a distância explode no Brasil
Em alguns casos, a demanda pela teleconsulta aumentou sete vezes em 15 dias
O Estado de S. Paulo - 06 de Abril de 2020Regulamentada às pressas no País por causa do surto de covid-19, a telemedicina teve nas duas últimas semanas uma explosão em número de atendimentos, conta o Estadão. As consultas a distância entraram na rotina de hospitais, operadoras e clínicas. Em alguns casos, a demanda pela teleconsulta aumentou sete vezes em 15 dias, segundo levantamento do jornal com empresas que oferecem a modalidade.
Por
resistência principalmente de conselhos regionais de medicina, atendimentos
online não eram permitidos no Brasil até março. No dia 19, com a escalada da
covid-19 e a necessidade de reduzir a ida desnecessária a prontos-socorros, o
Conselho Federal de Medicina (CFM) liberou, temporariamente, atendimentos
virtuais para triagem e monitoramento de pacientes em isolamento. No dia 20, o
ministério editou portaria em que regulamentava a prática.
Centros
médicos que já ofereciam a modalidade mesmo sem aval do CFM tiveram alta
expressiva. No Hospital Albert Einstein, o número de teleconsultas diárias
saltou de 80 para 600. 'Cerca de 450 delas são por sintomas de covid-19 e
as outras 150 são de outras doenças. Estávamos com 100 médicos nesse projeto,
mas estamos contratando e devemos chegar a 500', diz Sidney Klajner,
presidente do Einstein.
Entre
os pacientes que usam a plataforma de telemedicina do hospital estão
beneficiários da Amil e da Care Plus. Na primeira, os atendimentos aumentaram
seis vezes. Na segunda, o número de teleconsultas passou de 100 por mês para
100 por dia. 'Já preconizávamos esse tipo de atendimento justamente em
situações como essas, em que o deslocamento não é recomendado. Além da parceria
com o Einstein para casos de pronto-atendimento, autorizamos todos os médicos
credenciados a fazerem consultas a distância', diz Ricardo Salem, diretor
médico da Care Plus.
Outras
dezenas de empresas adaptaram suas plataformas para passar a oferecer o
serviço. A Doctoralia usou a tecnologia de telemedicina que já tem em outros
países e começou a oferecer o atendimento virtual no Brasil no mesmo dia em que
a portaria do governo foi editada. Na primeira semana, agendou 5.170 consultas
virtuais. Na seguinte, o número passou para 8.855. 'Já tivemos 3 mil
profissionais cadastrados para atendimento online. Para poder atender pela
nossa plataforma, os médicos precisam ter o CRM e o RQE (registro de
especialista) validados', diz Cadu Lopes, CEO da Doctoralia. Ele conta que
as especialidades mais buscadas são psiquiatria, dermatologia, urologia e
ginecologia.
Na
GSC Integradora de Saúde, mais de 3 mil médicos se cadastraram em apenas 48
horas para oferecer o atendimento online. 'O objetivo é aumentar a oferta
de teleconsulta para tirar pacientes do front dos hospitais. Além de diminuir o
risco de colapso do sistema, evita que um paciente se contamine ou seja vetor
de transmissão para outras pessoas', destaca Ana Elisa Siqueira, CEO da
GSC.
A
rede de clínicas populares Dr.Consulta foi outra que também passou a oferecer
atendimento virtual após a regulamentação. Em duas semanas, já foram abertas
agendas para profissionais de 20 especialidades e feitas mais de 2 mil
consultas online, segundo Renato Pelissaro, diretor de Marketing e atendimento
ao cliente da companhia. 'A quantidade de atendimentos tem dobrado a cada
três ou quatro dias. Vemos que o público da consulta virtual é predominantemente
jovem e das classes A e B', relata.
Mas
há idosos que também têm usado o serviço para evitar a ida a um consultório,
conta Fabrícia Jung, médica do Dr.Consulta. 'São pessoas com doenças
crônicas que precisam ser monitoradas, mas com medo de sair de casa. Às vezes
só precisam de ajuste de tratamento, troca de receita. Já atendi um paciente de
85 anos e outro de 95 por videoconferência.'
Há
jovens que, mesmo fora do grupo de risco, buscam atendimento online para
preservar parentes idosos. 'Moro com minha mãe, que é idosa, e com meu
irmão, que tem problema respiratório. Estava há três dias com sintomas de
sinusite, mas não queria ir ao pronto-socorro para não correr risco de me
contaminar e trazer o vírus para casa', diz o gerente de recrutamento e
seleção Renan de Carlos Sertorio, de 30 anos, que buscou o atendimento online
da Care Plus. 'No começo fiquei meio receoso porque não sabia como o
médico poderia me examinar. Mas ele fez perguntas precisas, me passou alguns
medicamentos e estou 100%.'
Dificuldades.
Embora em alta, a falta de regulamentação prévia da telemedicina traz agora
insegurança para médicos e pacientes, diz Antonio Carlos Endrigo, diretor de
tecnologia da informação da Associação Paulista de Medicina (APM). 'A
portaria do ministério veio em boa hora, mas como não tínhamos normas prévias,
os médicos estão perdidos. Alguns estão usando o que têm à mão para
atendimentos, como whatsapp ou skype, mas essas não são as melhores formas de
garantir a privacidade dos dados.'
Procurado,
o CFM afirmou que concluiu em fevereiro a consulta pública para atualizar a
resolução de 2002. Não disse quando o documento deve ser concluído e publicado.