Nova Lei de Licitações traz avanços para seguro garantia
Entrevista com Pedro Mattosinho, Diretor de Garantia da Fator Seguradora
Sonho Seguro - 18 de Fevereiro de 2021Como será o seguro garantia após a sanção do projeto de Lei n° 4253/2020, que altera a Lei 8.666/93, conhecida como a Lei Geral de Licitações, que está na mesa do presidente Jair Bolsonaro (sem partido)? É possível fazer previsões otimistas para o segmento que está praticamente parado com a falta de obras de infraestrutura no Brasil.
Especialistas citam muitos benefícios que a nova lei traz para o segmento, que sofre uma crise de imagem por acumular um volume enorme de negativas de indenização de sinistro por diversas razões. Entre as mais comuns, a paralisação do empreendimento por falta de pagamento do governo, a falta de licença ambiental e o não cumprimento de cláusulas por parte do segurado, como avisar a seguradora sobre qualquer aditivo no contrato.
Depois do webinar “Impactos da nova lei de licitações” (https://www.youtube.com/watch?v=NQaI9DcOYaA), o blog Sonho Seguro foi conversar com o especialista Pedro Mattosinho, Diretor de Garantia da Fator Seguradora, um dos participantes do evento.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista.
Há alguma previsão para o presidente Jair Bolsonaro aprovar ou vetar a Lei de Licitações?
Não há uma data certa, pois depende da agenda do presidente Jair Bolsonaro. Algumas mídias comentam que pode ser ainda neste primeiro trimestre de 2021.
As novas regras entram em vigor imediatamente após a sanção?
Não. Há um prazo de dois anos de coexistência de regimes jurídicos, imediatamente a partir da sua publicação. Cada órgão público poderá adotar a nova lei ou a atual neste período.
É um período considerado suficiente para todos se adequarem, pois as exigências das seguradoras, com a retomada da obra, são consideráveis?
Sim, é um período suficiente para que todos se adequem ao novo processo, que é mais burocrático, porém com muito mais segurança jurídica para todos. Nós, na Fator, vamos nos adequar rapidamente, pois como o segurado, ou seja, o órgão público, pode exigir a utilização da Lei nova, já queremos estar prontos para isso e assim seguir crescendo neste segmento, tanto em vendas como em rentabilidade.
Explique de forma bem simples qual a função do seguro de garantia de contratos.
A seguradora cobre o custo para retomar a obra. Digamos que uma construtora vença a licitação por R$ 200 milhões. Semanas depois de começar a obra, por alguma razão, esta construtora quebra ou desite da empreitada. A seguradora vai buscar a segunda colocada no pregão, que ofertou, digamos, R$ 220 milhões. Esse custo adicional é coberto pelo seguro, em benefício do governo.
O setor tentou alterar um ponto do projeto da Câmara e no Senado e não conseguiu. Ainda dá tempo de tirar a palavra “até” 30% o valor do seguro com base no investimento da obra, percentual polemico pois o tomador pode comprar seguro para apenas 1% do valor da obra apenas para cumprir a lei?
Há uma discussão para tentar esclarecer a importância de retirar a palavra “até”, pois isso pode trazer problemas para todos, uma vez que a lei traz a obrigatoriedade da contratação do seguro pelos agentes públicos para obras acima de R$ 200 milhões. Um percentual de 5%, por exemplo, não atende aos anseios do governo. O que ele quer é ver a obra concluída. Esse é um esforço legitimo do governo, pois o Brasil é um canteiro inacabado. No entanto, o seguro garantia não é uma bala de prata. Ter um valor adequado de seguro garantia é primordial para concluir a obra em caso de imprevistos que levem o tomador a parar o empreendimento. E é isso que temos de mudar. E a nova lei estimula esta mudança com a cláusula de retomada.
Pode explicar o que é a clausula de retomada?
A missão como seguradora, do início ao fim, é concluir a obra. Na atual norma, a seguradora não acompanha a obra e nem tem liberdade para opinar sobre o projeto e acompanhar o fluxo da obra. Com a nova lei, passamos a ser intervenientes anuentes nas obras de grande vulto, com garantia de até 30%. Assinamos o contrato como se fossemos sócios. Temos o direito de acompanhar a obra e a obrigação de, em caso de algum problema com o tomador, assumir a obra e contratar uma nova construtora para concluir o projeto. Ou seja, de contratar uma segunda construtora para assumi-la com todos os desafios trabalhistas, logísticos e técnicos, pois cada obra tem a sua especificidade.
E isso aumenta o custo para as seguradoras?
Sim. Temos de ter uma equipe técnica para analisar tudo, começando pela situação financeira das construtoras e os termos do contrato. Depois disso, acompanharemos cada passo, desde a proposta, para checar se o projeto da construtora está dentro dos padrões técnicos, financeiros e com prazo de conclusão viável, até o dia a dia da obra para checar se tudo que foi acordado é colocado em prática dentro do orçamento e do prazo previsto. A corretora de seguros também passa a ter um papel mais consultivo do que transacional.
E para as construtoras, que são os tomadores ou contratantes do seguro?
Os tomadores terão de ser mais transparentes. Se quer R$ 300 milhões em crédito para um seguro garantia, terá de abrir dados de balanços. Sem essa de mandar o balanço via arquivo Excel. Precisa esclarecer dúvidas, dar acesso ao projeto, à precificação. É assim que as seguradoras irão calcular o valor disponível para o seguro. Com a nova Lei, acho difícil uma construtora conseguir um seguro da noite para o dia, como é feito hoje. Precisarão pensar no seguro garantia desde o início dos estudos para participar das licitações.
E para os órgãos públicos, que são os segurados?
No fim do dia, o espírito é que as seguradoras sirvam de filtro. Não apoiem empreiteiras que atuem de forma irresponsável, apenas para ganhar o contrato, sem de fato estar preparadas para concluir o empreendimento. O governo espera que o mercado segurador faça uma depuração. E certamente com a nova Lei isso será feito.
Mas há uma forte concorrência em garantia…
Sim, estamos num mercado “soft”, ou seja, com baixas taxas pois temos muitas companhias atuando neste segmento, mas poucas são especializadas. Acredito que com a nova lei ficarão somente as empresas que têm expertise neste seguro. Atualmente, o tomador, ou seja, a construtora, só pedia o seguro de última hora para constar no processo licitatório. Algumas delas sequer existiam e isso só era descoberto quando havia um sinistro. Agora, além da nova Lei de Licitações, temos novas regras da Susep. Trata-se do Sistema de Registro de Operações (SRO), que obriga que as apólices de garantia sejam registradas. E o segurado pode checar se a apólice está registrada na Susep e não é falsa. Atualmente quem cobra menos e faz menos perguntas acaba fazendo mais negócios, mas isso pode ser perigoso no cenário da nova Lei pois a responsabilidade é muito maior.
Por quê? A tecnologia tem ajudado com a emissão online das apólices de garantia…
Sim, a tecnologia fez com que a emissão do seguro garantia seja praticamente online. Mas fazer uma boa subscrição de risco tem um custo. Observamos executivos sendo demitidos pelo tamanho da perda registrada com sinistro e não por ter um crescimento de vendas menor. O seguro garantia tem poucos sinistros, mas quando acontecem custam muito caro. Considerando o maior nível de responsabilidade que assumiremos com a nova Lei, temos que entender e discutir, desde o início, a viabilidade dos projetos. Quando passamos a garantia para até 30% do valor da obra, a dinâmica muda. Precisamos entender claramente se o projeto faz sentido em relação ao aspecto técnico, do valor do investimento, do prazo da obra. E isso tem um custo. E se esta gestão não for bem feita, as chances de ter um sinistro é grande.
E a Fator Seguradora já está preparada para atuar no novo cenário, se aprovado pelo presidente Bolsonaro?
A Fator já se prepara para isso. Não trabalhamos com prazo de dois anos, e sim de três meses para estarmos aptos a jogar o novo jogo. Crescemos 60% em vendas no seguro garantia em 2020. A Fator Seguradora tem um perfil diferente do mercado, que tem 85% de garantias judiciais e 15% para o seguro de contratos. Na Fator, esta proporção sempre foi meio a meio. Em 2020, com a pandemia, o judicial acabou subindo para 60% diante da alta demanda das empresas para liberar recursos dados como caução em processos judiciais, e 40% são seguros garantias tradicionais. Temos boa base para crescer em 2021 com bons resultados. Equipe jovem e integrada, com bons relacionamentos e um sistema tecnológico e processo de decisão que nos dá muita agilidade. Neste mercado, se uma companhia demora para dar uma cotação, o cliente já fechou com a mais ágil mesmo que pague mais caro.