Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
CÓDIGO CIVIL OU LEI DO SEGURO?
O Código Civil esgota o tema? Não, nem é essa a sua missão 22 de Setembro de 2023O Código Civil traz um capítulo inteiro dedicado ao seguro. Lá está
colocada e regulamentada a operação, suas linhas mestras, definições,
tipicidades, obrigações das partes, enfim, o essencial para fazer um setor
econômico ter as premissas indispensáveis ao seu funcionamento harmonioso, que,
evidentemente, tem outras regulações, a maioria operacionais, mas que encontra
no diploma cível o fundamental para seu arcabouço jurídico.
O Código Civil esgota o tema? Não, nem é essa a sua missão. O Código
Civil dá os parâmetros dentro dos quais as regras para o setor devem ser
colocadas, visando a perfeição do negócio jurídico e, consequentemente, sua
validação perante a lei.
O Código Civil entrou em vigor em 2003. Logo, há pontos que precisam ser
atualizados, redefinidos, reescritos e mesmo incluídos no diploma legal para
aperfeiçoar suas diretrizes e melhorar as relações envolvendo a atividade
seguradora.
Mas, em linhas gerais, o Código Civil, ao longo das duas décadas em que
está em vigor, cumpriu razoavelmente seu papel no que diz respeito ao capítulo
dos seguros. A atividade tem base legal sólida e clara, parâmetros contratuais
definidos, regras impositivas suficientes para balizar a boa-fé das partes e,
acima de tudo, está escrito em português claro, onde as interpretações não têm
espaço para longos voos conceituais, invariavelmente mais focados na fama do
formulador da ideia do que na praticidade de sua adoção.
Para fazer tudo isso, o Código Civil tem mais ou menos cinquenta artigos
dedicados ao tema seguros. E eles são suficientes, até porque outras
legislações tratam de situações peculiares, como é o caso do Código de Defesa
do Consumidor, que tem suas regras aplicáveis às relações de consumo
decorrentes do negócio do seguro. Ou do Decreto-lei 73/66, lei complementar que
regula o “Sistema Nacional de Seguros Privados”.
Recente ato do Presidente do Senado Federal criou uma comissão de
juristas que tem como missão rever o Código Civil para adequá-lo às
necessidades atuais da sociedade brasileira. E, entre os temas que devem ser
estudos, está o capítulo do seguro, bem como outras matérias alvos de projetos
de lei substitutivos ou modificativos.
O Projeto de Lei que trata do seguro é o PLC 29/2017, conhecido como “Lei
do Seguro”. Ao longo de quase cento e cinquenta artigos, ele pretende revogar
integralmente o capítulo “Do Seguro” do Código Civil, bem como alterar pontos
do Código de Defesa do Consumidor, quando aplicáveis a temas atinentes ao
contrato de seguro.
A simples leitura do até agora exposto não deixa dúvidas: é muito mais
razoável se tratar do seguro na revisão ampla do Código Civil do que pretender
fazer uma costura complexa de regras inadequadas ou ultrapassadas pelo decurso
dos anos, através da votação de uma lei específica, feita em nome da proteção
do segurado, mas que ameaça seriamente essa segurança ao criar situações e
regras anacrônicas, complexas ou mesmo prejudiciais a todos os envolvidos na
avença.
Diz o caipira que caldo de galinha e cautela nunca fizeram mal a ninguém.
Mais do que nunca, o que o setor precisa é muita cautela e ponderação para não
comprometer uma atividade econômica que funciona bem, alterando suas regras em
nome de uma hipotética ciência e muita boa vontade.