Sócio de Penteado Mendonça e Char Advocacia e Presidente da Academia Paulista de Letras
AS MUNDAÇAS CLIMÁTICAS VÃO RESTRINGIR OS SEGUROS
As tempestades que atingem impiedosamente o Sul do Brasil, com ênfase no Rio Grande do Sul, são um primeiro retrato do que devemos ter pela frente ao longo dos próximos anos. 24 de Novembro de 2023As tempestades que atingem impiedosamente o Sul do Brasil, com ênfase no
Rio Grande do Sul, são um primeiro retrato do que devemos ter pela frente ao
longo dos próximos anos. Os eventos se tornarão cada vez mais frequentes e seus
danos serão cada vez mais severos. Tradicionalmente, o seguro se baseia na
premissa de que os danos mais frequentes são os de menor valor e os mais
severos acontecem mais espaçadamente. A velha e boa regra está em vias de
mudar. O que se viu ao longo de 2023 ao redor do planeta mostra o contrário.
Eventos mais frequentes estão causando danos mais severos.
Para quem quiser, cito, a título de exemplo, os incêndios florestais que
devoram regularmente a Califórnia, Portugal, Espanha, Grécia, Itália, etc. A
lista de nações e regiões atingidas não para de crescer, com o Brasil assumindo
lugar de destaque, com os incêndios na Amazônia e no Pantanal.
Mas não são apenas os incêndios que cobram um alto preço. Da mesma forma
que o Sul do Brasil, imensas áreas na Europa, na Ásia e em outras nações
americanas são inundadas por tempestades, vendavais, furacões e tufões, que
levam de roldão o que encontram pela frente.
O resultado disso é que a atividade seguradora internacional já não tem –
e cada vez terá menos – capacidade para fazer frente aos eventos de origem
climática que sacodem o planeta e comprometem a qualidade de vida do ser
humano.
Recentemente, o Estado da Flórida, nos Estados Unidos, deixou de ter
seguro para furacões e outros eventos de origem climática. Até agora, Miami não
tinha cobertura para esses riscos; daqui para frente, a restrição foi expandida
para todo o Estado. E a explicação para ela é simples: pela sua magnitude, as
seguradoras não têm capacidade para fazer frente aos danos decorrentes de
eventos dessa natureza que atinjam a Flórida.
É importante analisar como o setor funciona para entender o que está
acontecendo e que deve afetar cada vez mais territórios, que, em função do
aumento dos eventos de origem climática, também ficarão sem cobertura de
seguro.
A atividade seguradora é das mais interligadas do mundo. As seguradoras e
resseguradoras, pelas tipicidades do negócio, são ligadas por uma vasta rede de
vasos intercomunicantes, que dividem os riscos assumidos por empresas
espalhadas ao redor do mundo. Esta característica fazia com que as perdas
sofridas numa determinada região fossem compensadas pelos seguros vendidos em
outras partes que não eram atingidas pelo mesmo tipo de evento. Assim, o
mutualismo e a capilaridade do seguro eram capazes de manter o equilíbrio das
contas do setor. Mesmo os eventos com grande capacidade de destruição, em
função de sua baixa frequência, eram suportáveis e podiam ser segurados.
De algum tempo para cá, essa realidade mudou completamente. Incêndios
florestais devassam ao mesmo tempo, ou em sequência, Estados Unidos, Canadá,
Europa, Ásia e América do Sul. Tempestades, furacões e ciclones atingem as mais
variadas regiões do planeta. E, para completar, pandemias como a da Covid19
ameaçam entrar em cena.
O resultado é que o setor de seguros não tem recursos para indenizar
todos esses danos, principalmente porque
eles acontecem em tempo cada vez mais curto. A única forma das seguradoras se
protegerem é deixar de aceitar determinados riscos, que, pela sua natureza,
terão maior frequência e causarão mais danos.